sábado, 22 de outubro de 2016

Mãe,obrigado por tudo!

Publicado no Jornal Tribuna das Monções no dia 21 de Outubro de 2016
Aquela manhã de segunda-feira dia 17 de outubro de 2016, tinha tudo para ser um dia como os outros, mas não foi. No domingo já era quase meia noite quando eu e o Miguel trocamos a sua cama para refrescar porque estava muito calor e aproveitamos para fazer-lhe uma massagem. Ao final a senhora ficou bem, perfumada, parecia estar feliz e olhou profundamente para nós dois, como quem quisesse dizer-nos: “Obrigada”.
               A noite foi como tantas outras. Recordo-me que já era quase quatro horas quando a senhora tossiu e eu me levantei para fazer os procedimentos necessários e como ainda era muito cedo, voltei descansar mais um pouco. Foi a última vez que eu te vi com vida porque quando se aproximava das seis da manhã eu tentei acorda-la, mas foi em vão, a senhora tinha adormecido, para sempre!
             Eu não posso reclamar, fui eu, que numa das minhas conversas com Deus pedi para que a senhora fosse dessa forma, em paz, em casa, porque já havias sofrido muito em hospitais e UTI. Mas, eu não esperava que fosse naquele dia, que tudo se acabasse ali naquela manhã, provando o quanto é tênue a linha entre a vida e a morte.  
              Vida, nós a vivemos intensamente! Fomos muito felizes, sempre muito unidas. Divertimos-nos, passeamos, enfim a senhora gostava do que era belo e buscava viver da melhor maneira. Eu nunca passei um dia nesses 53 anos sem falar com a senhora, mesmo quando viajava a trabalho, meu coração só acalmava quando eu ouvia sua voz dizendo que tudo estava bem.
           Deus nos separou aos poucos. Primeiro foi aquele tombo que não deixou que a senhora me acompanhasse mais. Depois foi o AVC que levou parte da sua memória, do seu entendimento. Depois a crise de janeiro de 2014 que a deixou acamada definitivamente sem se movimentar, alimentando só através de sonda e sem falar.
               Só que, apesar de tudo, a senhora estava na minha casa e naqueles momentos que a tristeza e a angústia chegavam eu podia abraçá-la, sentir o seu calor, o seu cheiro, ter o seu colo!  Ah! Mãe como dói, entrar naquele quarto e não te ver mais e saber que isso é para sempre. Antes você ia para o hospital, mas como era uma fortaleza, sempre voltava.     
              Teve alguns dias em que eu estive tão triste porque eu sabia que estavas sofrendo muito. Literalmente falando, a senhora estava “pele e osso”. As escaras estavam tomando conta do seu corpo e eu, já não sabia mais o que fazer para aliviar aquelas dores que certamente sentias, mas aguentava quieta, sem pronunciar um “ai”!
             Eu tenho certeza que agora a senhora está feliz, que depois de quase 26 anos encontrou com ele, o meu pai. Eu sei que a senhora pensava nisso desde quando ele se foi porque apesar da pouca idade, nunca quis ter outro alguém. Queria ele para a eternidade e esperou por esse dia. A senhora estava tão bonita, tão serena para esse momento que nem parecia que tinha sofrido tanto.
             Em nossas conversas, quando ainda podia falar e tinha consciência do que dizia, pediste para que eu não chorasse quando a senhora partisse. E se fosse agora me diria: “Por que chorar? Você acha que aquilo que eu estava vivendo era uma vida?”. Sim eu sei que era uma alma presa num corpo doente.  Mas, não chorar é impossível, eu preciso viver o meu luto, eu preciso sentir essa dor para que depois eu possa continuar a minha caminhada.

            Mesmo em prantos, agradeço a Deus porque enquanto muitos perdem sua mãe no momento do nascimento ou ainda quando criança, eu tive o privilégio de tê-la por 53 anos. Mãe, obrigada por tudo e descanse em paz!           

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